quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

just a mess.

Bom, resolvi fazer um novo texto; chega das palhaçadas que eu tenho escrito por aqui.
O blog está meio abandonado, não tenho tido muito tempo para escrever coisas novas ou divulgá-lo por aí por causa da minha vidinha de pré-vestibulanda, mas isso não vem ao caso...
A maior parte das coisas que tenho escrito foram produzidas durante alguma aula, por isso ficaram ruins: não consigo me concentrar com gente ao redor.

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  Sentou-se na cadeira. Parou, refletiu. Milhares de ideias surgiram na sua cabeça, mas nenhuma delas veio à tona.
  As mãos coçavam, suavam, estavam frias. A mente inquieta o impedia de respirar. Esperava por algo surpreendente, inovador. Sentia algo surpreendente, inovador. Sentia tantas coisas que não conseguia focar-se num só sentimento. Era impossível passar aquilo tudo para o papel que estava à sua frente.
  Ele queria gritar e sair por aí falando tudo o que vinha a mente. Queria expor tudo o que sentia. Mas o peso de seus sentimentos não o deixava se locomover ou ao menos pronunciar alguma palavra que tivesse algo a ver menos com sua cabeça do que com sua alma. O que o impedia de desistir era a ideia de escrever, se fazer leve. Mas escrever ele não podia. Nem pensar ele podia. Estava tão intenso, em si mesmado, que seria um alívio tirá-lo daquele estado.
  Mas ele desejava algo muito além do que ele mesmo sabia que queria. Ou alguém. Para libertá-lo e torná-lo mais leve. Para distrai-lo e diverti-lo. Alguém que desejasse senti-lo perto de seu corpo, ouvir sua respiração, abraçá-lo forte e sutilmente. Alguém que pudesse chegar mais... perto.

sexta-feira, 19 de fevereiro de 2010

Reflexão íntima

Há tantos espaços, tantos vácuos e vazios, tantas interferências entre a alma e o corpo, entre a ação de ser e o próprio ser. Há uma coisa chamada senso, filtro.
Há tanto de você nas coisas que escreve, que até assusta. E assusta porque você tem medo. Medo de decepcionar aqueles que se atentam a sua escrita. E isso devido ao fato de que você é tudo aquilo que transparece através da escrita, mas não simplesmente isso. Não esqueça do filtro, leitor. Ele está aí para todos.
Há a alma, pura e simplesmente. E essa você conhece como ninguém. Melhor até mesmo do que aqueles que convivem com o escritor. Mas também há uma coisa chamada "jeito", e este é um desconhecido. Você pode imaginá-lo, criar expectativas a respeito dele, mas nunca será certeiro.
Seria a alma mais importante que tudo? Não acho. O conjunto é o que importa, o pacote, a união. Ter uma coisa sem a outra é como pisar sobre um terreno desconhecido de olhos vendados. 

quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010

Quando escrevo
eu vivo, eu morro.
E me faço nascer, 
me crio, me invento.

Quando existo
eu morro e só morro.
E me faço renascer, 
por mais difícil que seja.

Quando deliro
eu vivo e só vivo.
E me deixo levar pelo
meu mundo convosco.

domingo, 14 de fevereiro de 2010

"Nada alterava o fato de ela ser uma menina magrela e perdida em mais um lugar estranho, com mais gente estranha. Sozinha."

A Menina que Roubava Livros, Markus Zusak.

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Tentação

   Ela estava com soluço. E como se não bastasse a claridade das duas horas, ela era ruiva.
   Na rua vazia as pedras vibravam de calor - a cabeça da menina flamejava. Sentada nos degraus de sua casa, ela suportava. Ninguém na rua, só uma pessoa esperando inutilmente no ponto do bonde. E como se não bastasse seu olhar submisso e paciente, o soluço a interrompia de momento a momento, abalando o queixo que se apoiava conformado na mão. Que fazer de uma menina ruiva com soluço? Olhamo-nos sem palavras, desalento contra desalento. Na rua deserta nenhum sinal de bonde. Numa terra de morenos, ser ruivo era uma revolta involuntária. Que importava se num dia futuro sua marca ia fazê-la erguer insolente uma cabeça de mulher? Por enquanto ela estava sentada num degrau faiscante da porta, às duas horas. O que a salvava era uma bolsa velha de senhora, com alça partida. Segurava-a com um amor conjugal já habituado, apertando-a contra os joelhos.
   Foi quando se aproximou a sua outra metade neste mundo, um irmão em Grajaú. A possibilidade de comunicação surgiu no ângulo quente da esquina, acompanhando uma senhora, e encarnada na figura de um cão. Era um basset lindo e miserável, doce sob a sua fatalidade. Era um basset ruivo.
   Lá vinha ele trotando, à frente de sua dona, arrastando seu comprimento. Desprevenido, acostumado, cachorro.
   A menina abriu os olhos pasmada. Suavemente avisado, o cachorro estacou diante dela. Sua língua vibrava. Ambos se olhavam.
    Entre tantos seres que estão prontos para se tornarem donos de outro ser, lá estava a menina que viera ao mundo para ter aquele cachorro. Ele fremia suavemente, sem latir. Ela olhava-o sob os cabelos, fascinada, séria. Quanto tempo se passava? Um grande soluço sacudiu-a desafinado. Ele nem sequer tremeu. Também ela passou por cima do soluço e continuou a fitá-lo.
    Os pêlos de ambos eram curtos, vermelhos.
    Que foi que se disseram? Não se sabe. Sabe-se apenas que se comunicaram rapidamente, pois não havia tempo. Sabe-se também que sem falar eles se pediam. Pediam-se com urgência, com encabulamento, surpreendidos.
   No meio de tanta vaga impossibilidade e de tanto sol, ali estava a solução para a criança vermelha. E no meio de tantas ruas a serem trotadas, de tantos cães maiores, de tantos esgotos secos - lá estava uma menina, como se fora carne de sua ruiva carne. Eles se fitavam profundos, entregues, ausentes de Grajaú. Mais um instante e o suspenso sonho se quebraria, cedendo talvez à gravidade com que se pediam.
   Mas ambos eram comprometidos.
   Ela com sua infância impossível, o centro da inocência que só se abriria quando ela fosse uma mulher. Ele, com sua natureza aprisionada.
   A dona esperava impaciente sob o guarda-sol. O basset ruivo afinal despregou-se da menina e saiu sonâmbulo. Ela ficou espantada, com o acontecimento nas mãos, numa mudez que nem pai nem mãe compreenderiam. Acompanhou-o com olhos pretos que mal acreditavam, debruçada sobre a bolsa e os joelhos, até vê-la dobrar a outra esquina.
   Mas ele foi mais forte que ela. Nem uma só vez olhou para trás.

Clarice Lispector

sábado, 13 de fevereiro de 2010

Contemplação Filosófica

Faço uso de ti
para te escrever,
para nos escrever
e me reescrever a cada dia.

Faço que não sei,
mas sou um laço
no qual eu própria
me apeguei.

Faço bolhas na minha
cabeça de vento para
não admitir o que invento;
não sinto.

Faço que não me vejo,
embora enxergue;
sinto tudo.

quinta-feira, 11 de fevereiro de 2010

Delírio durante alguns minutos naquela sala


Enquanto a chuva caía lá fora, estive cá dentro; enrolada e algemada nos meus próprios pensamentos.
Queria estar perto de alguém... alguém que não existe. Ou existe? Não sei. Mas as ilusões já chegam a encharcar minha mente doente e contemplatória.
Tenho tanta coisa, mas não posso mostrar o que invento ou sinto... é demais para o momento; é demasiado complexo acompanhar meu pensamento. Mas se quiser me ler, deixarei.
Por favor, leia-me. Sou cheia de espaços, mas também cheia de montes altos... Por favor, preencha-me.
Mas eu estou perdida, e não acredito em mais nada. Minhas esperanças transformaram-se em vácuos e a tristeza vem dos lugares mais inesperados.

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

Garota interrompida

Neurônios latentes.
Nervos extremamente conscientes.
Corpo aflito.
Abafado grito.

Canção do vento.
Perdido momento.
Criatura do luar
Aquiesce.

Vastos campos
de cetim, diamantes
a procurar...

Símbolo vil
este que se abriu
a devastar.

terça-feira, 9 de fevereiro de 2010

Ma Petit

Sou pequenina como
a formiga que tenta
sobreviver perante gigantes.

Sou intensa como
a paixão fulminante e
impossível dos sonhadores.

Sou invisível como
o perfume doce
que viaja através do tempo.

Mas sou tão grande...
grande do jeito que ninguém
jamais me viu.

domingo, 7 de fevereiro de 2010

Momento III

O momento de cada instante
passa como a delícia das infâncias
e brinca e se esconde dos
meus sentidos.
Posso sentir sua suave brisa,
seu dissimulado halo, mas não
posso enxergá-lo.
Vai, assim, se esvaindo, até que
acaba por acabar.

sexta-feira, 5 de fevereiro de 2010

Conto de uma vida

À mercê do tempo, a contar as lágrimas
Evapora a vida aos poucos;
Morro de algo invisível, impossível
Que ninguém diz, que ninguém sabe -
Esse que jamais ouviu a verdade
Que ecoa dentro da alma e enche
O pensamento a transbordar de
Lamúrias, versos que nunca soube dizer.

Que alguém mande dos Céus um
Presente Divino que me faça acreditar
Que estimo a jornada do viver. Senão,
Creio que posso morrer de tanto pensar
E de tanto saber e de tanto penar
Neste infinito sofrer que já nem é
Mais amargura: é já vontade de
Inexistir na intensa madrugada
De um tempo alheio,
De uma vida passada.

Por sentir, morro, e, por não
Sentir, morro também...
Me diz: para que permanecer
Se não há paz, meu bem?
Estive desde muito tempo a
Procurar algo que me levasse
Além, e descobri nada, desde então;
Continuo solidificada na estrada da
Solidão, seja por prazer, seja por
Tensão, a esperar que alguém
Me estenda a mão.

Fico por aqui, permaneço, continuo...
Se Deus o quer, não pode ser em vão;
Que o gosto amargo desapareça e que
O cravo seja retirado do meu coração...

terça-feira, 2 de fevereiro de 2010

Meu ideal seria escrever...

Hoje não vou postar nada de minha autoria. Sinto vontade de escrever, mas ainda não sei sobre o quê. Segue abaixo a crônica "Meu ideal seria escrever..." de Rubem Braga. Linda!

Meu ideal seria escrever uma história tão engraçada que aquela moça que está doente naquela casa cinzenta quando lesse minha história no jornal risse, risse tanto que chegasse a chorar e dissesse -- "ai meu Deus, que história mais engraçada!". E então a contasse para a cozinheira e telefonasse para duas ou três amigas para contar a história; e todos a quem ela contasse rissem muito e ficassem alegremente espantados de vê-la tão alegre. Ah, que minha história fosse como um raio de sol, irresistivelmente louro, quente, vivo, em sua vida de moça reclusa, enlutada, doente. Que ela mesma ficasse admirada ouvindo o próprio riso, e depois repetisse para si própria -- "mas essa história é mesmo muito engraçada!".

Que um casal que estivesse em casa mal-humorado, o marido bastante aborrecido com a mulher, a mulher bastante irritada com o marido, que esse casal também fosse atingido pela minha história. O marido a leria e começaria a rir, o que aumentaria a irritação da mulher. Mas depois que esta, apesar de sua má vontade, tomasse conhecimento da história, ela também risse muito, e ficassem os dois rindo sem poder olhar um para o outro sem rir mais; e que um, ouvindo aquele riso do outro, se lembrasse do alegre tempo de namoro, e reencontrassem os dois a alegria perdida de estarem juntos.

Que nas cadeias, nos hospitais, em todas as salas de espera a minha história chegasse -- e tão fascinante de graça, tão irresistível, tão colorida e tão pura que todos limpassem seu coração com lágrimas de alegria; que o comissário do distrito, depois de ler minha história, mandasse soltar aqueles bêbados e também aqueles pobres mulheres colhidas na calçada e lhes dissesse -- "por favor, se comportem, que diabo! Eu não gosto de prender ninguém!" . E que assim todos tratassem melhor seus empregados, seus dependentes e seus semelhantes em alegre e espontânea homenagem à minha história.

E que ela aos poucos se espalhasse pelo mundo e fosse contada de mil maneiras, e fosse atribuída a um persa, na Nigéria, a um australiano, em Dublin, a um japonês, em Chicago -- mas que em todas as línguas ela guardasse a sua frescura, a sua pureza, o seu encanto surpreendente; e que no fundo de uma aldeia da China, um chinês muito pobre, muito sábio e muito velho dissesse: "Nunca ouvi uma história assim tão engraçada e tão boa em toda a minha vida; valeu a pena ter vivido até hoje para ouvi-la; essa história não pode ter sido inventada por nenhum homem, foi com certeza algum anjo tagarela que a contou aos ouvidos de um santo que dormia, e que ele pensou que já estivesse morto; sim, deve ser uma história do céu que se filtrou por acaso até nosso conhecimento; é divina".

E quando todos me perguntassem -- "mas de onde é que você tirou essa história?" -- eu responderia que ela não é minha, que eu a ouvi por acaso na rua, de um desconhecido que a contava a outro desconhecido, e que por sinal começara a contar assim: "Ontem ouvi um sujeito contar uma história...".

E eu esconderia completamente a humilde verdade: que eu inventei toda a minha história em um só segundo, quando pensei na tristeza daquela moça que está doente, que sempre está doente e sempre está de luto e sozinha naquela pequena casa cinzenta de meu bairro.